Haviam trés pombas no galho daquela acácia quando ele sentou do meu lado. Logo imaginei ser um chato buscando me irritar naquele dia em que eu não queria papo. Mas não. Ele manteve silencio e olhou para cima.
Com o canto do olho delineei o tipo estranho. Parecia aquele cara das mãos de tesoura. Uma cicatriz no lábio me chamou atenção e resolvi testá-lo.
Falei um monte de coisas viajantes. No fundo era bem o que eu sentia, mas ninguém precisava saber. Tinha certeza: nem escutaria. Sempre tive boas táticas para espantar rapazes.
- Sabe quando tu te sente perdida? Como se repentinamente tu acordasse em um corpo errado! Esquizofrenia isso, total! Mas sou mais aleatória pra mim quanto tu é e quanto as ultimas dez pessoas que passaram por aqui também são. Tenso!
Meu plano não deu certo, ele ficou calado, sem sentimentos nem aquele tremor de boca que o 'mãos de tesoura' tem as vezes. Como é mesmo o nome daquele cara?
O jeito foi chamá-lo pra um café. Já era outono e não existe algo melhor do que um ser completamente avulso disposto a me escutar num café. Foi tão estranho! Ele não disse nada. Era muito Tim Burton, ele...
Falei mais algumas coisas. Ele resmungou. Seus dedos eram finos e brancos, com aqueles calos de quem toca algum instrumento musical. Depois descobri: no fim do primeiro encontro que ele tinha uma voz agradável, no segundo que tocava piano e guitarra. Por sorte não era jardineiro, nem chamava-se Edward.
Dissemos um "obrigada" ao mesmo tempo no fim do primeiro encontro. Um obrigado e aquela memória fraca de sempre, dos dois: não dissemos nossos nomes. Eu sempre digo que isso nem é tão importante. E nem foi mesmo!
Deixamos por conta do acaso. E nos encontramos mais, muitas vezes e as coisas fluiram: musicas, filmes, mais café:
- Podemos chamar esse cachorro de nosso? Ele sempre vem aqui. - ele disse.
- Podemos escolher outro nome? Tipo... Lapela ou gravata?
- Gosto de gravata! Ele até atende, olha? - como ele ria engraçado. Ai!
Ele gostava muito de cachorros e folhas pelo chão.
Andamos de mãos. Mas não demos as mãos no primeiro dia, nem no ultimo. O ultimo que também foi por acaso, dias antes de eu viajar, no começo da primavera. Saí correndo, não teve adeus.
Petrus, teu piano ecoa sempre ao entardecer. As folhas cobrem o chão do norte e o outono não é o mesmo sem você. Pisarei nas folhas agora, fica irritado?! Lembro o quanto tu odeia isso.
Aí é primavera...
Saudades do teu espirro e de você...
2 comentários:
não sou tão girafa, mas gostaria de comentar..posso?
cheguei no teu blog porque tu chegou no meu... de uma forma que ainda não compreendi, nem sequer perguntei.
de qualquer forma
blogs com esse estilo leve mas profundo, que falam sem serem explícitos, que contam as histórias pelos sentimentos e objetos ao redor, me encantam muito.
essa forma leve, metafórica e abstrata de escrever me fascina.
mais um blog para se acompanhar :)
;)
Oi!
Obrigada pela visita no meu blog!
Já linkei o teu endereço ao meu.
Abraços.
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